AVELAR

Há trinta anos atrás, na sala de espera do consultório do médico Adolfo Rocha - Miguel Torga - eu e a minha irmã, esperávamos por uma consulta de um outro médico que não Adolfo Rocha.

A minha irmã, ainda criança, ia brincando e saltando nas cadeiras e falando alto como é próprio das crianças. Abrimos a janela que dava para a o "largo da portagem" ou Praça António Arriaga e de onde se via o rio Mondego e a ponte de Santa Clara. Incomodado com a algazarra, com certeza que estaria concentrado a escrever mais um poema, Miguel Torga abre a porta do seu consultório e dá-nos um breve sermão, dizendo para fecharmos a janela e que não queria barulho. Na época não sabia quem era este homem alto, magro, um tanto curvado e de rosto anguloso e olhar carregado pelas sobrancelhas fartas e franzidas. Mais tarde é que descobri que afinal Adolfo Rocha era nem mais nem menos que Miguel Torga e que  tinha estado na sua presença e sentido o seu mau humos momentâneo...